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Nathália Petry

3 dicas para viver a Páscoa sem medo do chocolate

Nas últimas semanas, com a Páscoa chegando, escutei diversas angústias acerca desse momento e do chocolate: o medo de perder o controle e comer muito chocolate, o medo de engordar, a ansiedade de ter muito chocolate em casa, o medo de estar cercado de comida no almoço de Páscoa... são vários os sentimentos negativos que têm invadido essa época do ano, que tradicionalmente deveria ser um momento de reflexão, introspecção, alegria e compartilhamento. Como eu disse em uma palestra que dei semana passada, justamente sobre o bendito chocolate, estamos cada vez mais adicionando novos significados à Páscoa, e, infelizmente, não são significados positivos. E eu fico muito triste em ver uma época que deveria ser tão bonita sendo manchada com sentimentos de culpa, vergonha e medo e tudo isso apenas por causa da comida!


Por isso, na palestra, eu trouxe três dicas, ou três reflexões, para lidar com a Páscoa de um jeito diferente, em meio a toda essa polêmica que estamos vivendo, e resolvi compartilhá-las aqui:


1) Respeite os sinais do seu corpo antes, durante e depois desse período: você não precisa compensar


Tem sido comum pessoas me relatarem a estratégia de fazer uma espécie de compensação para poder comer o chocolate sem tanta culpa na Páscoa, seja uma compensação prévia (fazer dieta na semana anterior, não comer doces nos dias prévios, pular refeições, comer pouco) ou uma compensação posterior (se exercitar muito, fazer jejum no dia seguinte, iniciar uma dieta restritiva). Porém, isso me assusta muito, pois estas compensações acabam sendo um tiro no pé pois elas já estão preparando você para exagerar no domingo de Páscoa. Quer dizer, se você ficar a semana toda sem comer chocolate, esperando ansiosamente para o domingo, é muito possível que o pedaço de chocolate que você iria comer no domingo aumente consideravelmente, ou até que você tenha uma compulsão alimentar nesse dia. A mesma coisa ocorre se eu já me programo para fazer dieta no dia posterior: aí meu cérebro pensa assim "não vou poder comer mais amanhã, então vou comer tudo que eu posso hoje e amanhã recomeço a dieta". E aí que nossos medos com a Páscoa, de se descontrolar, de exagerar no chocolate, de passar mal de comer, tem grande chance de se consolidar!


Os artigos têm sido muito certeiros nesse ponto, mostrando que todo o tipo de privação (seja uma na semana anterior, real, ou uma na semana seguinte, que nem aconteceu ainda) faz com que você acabe comendo exageradamente no dia permitido (ou seja, na Páscoa). O estudo de Bernardi (et al, 2005) encontra que as pessoas que mais faziam restrições e compensações foram as que mais comeram no final do estudo, quando todo o consumo foi calculado.


Então, pelo contrário, coma normalmente nos dias que antecedem estas ceias e nos dias seguintes, respeitando sua fome, sua saciedade e até comendo chocolate também, com tranquilidade e saboreando! Você não precisa compensar nada! Mesmo que você tenha comido um pouco a mais no fim de semana de Páscoa (o que não é algo anormal, afinal podemos ultrapassar a nossa saciedade por vários motivos, como sabor muito gostoso, momento especial..), seu corpo é totalmente capaz de lidar com isso!





E a nossa segunda dica da semana de Páscoa, da #debemcommeupratonapáscoa, é: 2) Faça as pazes com o chocolate. Ele não é o vilão!

Precisamos ter em mente que não há alimento vilão ou salvador, mocinho ou bandido. Nenhum alimento, nem mesmo o chocolate, pode promover ganho de peso ou má saúde instantaneamente. Nossa alimentação é um balanço de tudo que comemos, e o peso que temos e a nossa saúde dependerão disso (mas também de muitos outros fatores).

Inclusive, estudos têm mostrado que quanto mais colocamos o alimento na posição de vilão e evitado, mais acabamos obsessivos por ele e mais o comemos. O estudo de Erskine e Geourgiou (2010) mostra bem isso: os participantes que mais tentaram não pensar em chocolate e não comê-lo, foram os que mais tiveram desejos intensos por esse alimento e em muitos momentos acabaram o comendo excessivamente.

O autor Paul Rozin, referência em comportamento alimentar, diz: "Preocupar-se com a comida não faz bem para você". Ele coloca que a obesidade e doenças cardiovasculares na América não são causadas necessariamente pelo o quê comemos, mas pelo como comemos: de forma ansiosa, obcecada por Nutrição, contando calorias e nutrientes, eliminando alimentos e então os comendo compulsivamente". Bem assim, né?...

Assim, precisamos urgentemente parar de demonizar e santificar alimentos e entender que os alimentos não têm esse poder todo na nossa vida. Eles não nos matam, engordam, nem elevam ou santificam. Na verdade, costumo dizer que na alimentação o que vale é aquela frase bem clichê: o que faz o veneno é a dose. Ou seja, podemos comer absolutamente de tudo, inclusive chocolate ao leite!!, e isso poderá sim fazer parte de uma alimentação saudável. Uma alimentação saudável pode ter arroz, pizza, hambúrguer também.

Mas Nathália, como saber a dose? Aí é que está a questão: não há medida certa ou fórmula que funciona pra todos. Cada um de nós tem um organismo que tem o poder de nos dizer o quanto comer. É para isso que temos um sinal chamado saciedade! E quanto mais prestamos atenção nele, mais vamos tendo a consciência do quanto queremos e precisamos comer daquela refeição ou alimento!

Que tal fazer essa experiência na Páscoa? Olhe para o chocolate pelo que ele é: como chocolate. Se tiver vontade, coma! Aproveite essa época linda do ano! E aproveitar nada mais é que comer "gostoso" (como dizia uma paciente minha), isto é saboreie, deguste, deixe derreter na boca! E com isso vá percebendo em seu corpo, em seu estômago, na sua língua, o quanto mais você quer comer nesse momento? (lembrando que se você não irá compensar na segunda feira então, você pode comer mais também na segunda-feira, e não precisa comer tudo hoje ).

E a terceira e última dica para ficar #debemcommeupratonapáscoa é a que eu mais gosto e a que eu considero a mais importante: 3) Faça um compromisso consigo mesmo de ter momentos prazerosos.

Você já percebeu que vivemos um grande paradoxo? No meu consultório, a grande maioria (se não todos) chegam para mim dizendo: "Nathália, eu gosto muuuuito de comer". Mas quando vamos investigar e entender seu comportamento alimentar, percebemos que eles costumam engolir a comida, comendo muitas vezes sem nem perceber. Não é curioso que gastemos tão pouco tempo e tão pouca atenção em algo que gostamos muito?

Segundo as autoras da Alimentação Intuitiva, o prazer de comer não é um plus, um bônus para nós. Ele faz parte do processo do comer. É através do saborear que nós nos conectamos com a comida! Quando saboreamos, passamos a comer um pouco mais devagar, usamos um pouco mais de atenção, damos tempo para o nosso corpo processar o sinal de saciedade, e o momento se torna muito mais gostoso!

Nunca vou esquecer de um dia que fiz uma dinâmica com uma querida pacientinha de 9 anos, que fez uma grande descoberta! Dei a ela um pedacinho de chocolate, que foi comido por ela quase que imediatamente, mastigado rapidamente e logo engolido. Depois, pedi para ela fechar os olhos e ir comendo outro pedaço do chocolate pensando nas questões que eu levantaria na seguinte prática de Mindful Eating: * Pegue o chocolate com cuidado e aproxime do nariz. Que cheiro ele tem? Como é esse cheiro? Qual é a sensação em seu nariz quando você sente o seu aroma? O que lhe vêm a cabeça? * Leve o à boca. Deixe esse quadradinho sobre a língua. Que sabor lhe vêm à boca? Qual a temperatura desse chocolate? Qual sua textura? Ele derrete fácil? O que lhe vêm a cabeça? * Deixe esse chocolate rolar em sua boca. Qual é a sensação quando ele toca suas bochechas? O sabor é diferente? O sabor é diferente nas diferentes partes da língua? O que lhe vem a cabeça? * Se sentir necessidade, mastigue um pedacinho desse chocolate. Como é o sabor que é liberado? É diferente do que deixá-lo derreter? Quais sensações ele te desperta? * Vá engolindo esse chocolate aos poucos. Qual é a sensação de engolí-lo? Qual sabor fica na boca? Qual sensação ficou na sua boca? Após abrir os olhos, pedi para ela me contar se houve diferença entre aquele primeiro chocolate que ela comeu e este segundo (eram da mesma barra de chocolate). Ela olhou para mim e disse: "nossa, o segundo foi cinco vezes mais gostoso!".

Pois é, saborear (claro que nem sempre vamos demandar tanto tempo e atenção ao comer) torna o comer muito mais gostoso. Por quê temos ignorado isso? O prazer de comer é tão importante que o Guia Alimentar Japonês tem como uma das suas diretrizes: "Que toda atividade relativa à comida ou ao comer seja prazerosa".

E esse é compromisso que quero desafiar você a fazer, um convite que é lançado pelas próprias autoras da Alimentação Intuitiva: "Faça um compromisso consigo de ter refeições prazerosas".

E, aproveitando o gancho do chocolate, que tal nesse domingo de Páscoa fazer uma experiência de comer o chocolate de uma forma diferente (como na meditação acima)?

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